Polícia
FARRA DO INSS: CGU suspeita de fraude em procuração à advogada sem OAB

Documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre a atuação da União Brasileira dos Aposentados da Previdência (Unibap) acerca da realização de descontos de aposentados apontam para suspeitas de que a entidade teria apresentado uma procuração cuja data de assinatura seria “materialmente impossível”, configurando indícios de fraude.
Um dos documentos analisados pela CGU indica que a entidade dava poderes a uma advogada que só teria registro profissional ativo meses depois da data indicada no documento.
Conforme a apuração da Controladoria, a entidade inicialmente apresentou uma procuração, datada de 6 de novembro de 2018, outorgando poderes para três advogados associados. Tal documento era assinado pelo então presidente da entidade.
Já a procuração supostamente fraudulenta, assinada pela então vice-presidente, Silvia Maria Sento, era datada do dia seguinte, 7 de novembro de 2018, e incluía a outorga para uma quarta advogada. A profissional, no entanto, segundo o INSS, só passaria no exame da Ordem em fevereiro de 2019.
A entidade diz que não tinha ciência de que a advogada não possuía registo ativo à época.
“Considerando que as procurações foram feitas em dias sucessivos, bem como a ampliação do número de outorgados no instrumento firmado pela Vice-Presidente da associação, em buscas realizadas na internet foi constatado que a Dra foi aprovada no XXVII Exame da Ordem Unificado, com resultado publicado no dia 26/02/2019, data posterior a constante no instrumento de procuração apresentado”, afirmou o INSS em despacho da Divisão de Acordos Nacionais de Benefícios, de agosto de 2020.

A mesma constatação foi incluída em despacho de anulação do ACT, “reforçando a gravidade das irregularidades apontadas”. No documento, o INSS afirma que a procuração apresentada pela então vice-presidente não apresentava o “requisito de contemporaneidade exigido para superar a irregularidade constatada no ato de formalização do ajuste, uma vez que certamente não foi emitida na data de 07/11/2018”.
Segundo a CGU, a conduta caracterizaria, em tese, uma violação ao Acordo de Cooperação Técnica (ACT) firmado com o INSS – instrumento utilizado pela associação para realizar os descontos nas folhas de pagamento dos aposentados.
“Adicionalmente, tal prática configura, ainda que em tese, ato lesivo à Administração Pública, nos termos do art. 5o, inciso V, da Lei no 12.846/2013 (Lei Anticorrupção), por consistir na apresentação de documento inidôneo com o objetivo de dificultar atividade de investigação e fiscalização conduzidas pelos órgãos públicos competentes”, conclui a Controladoria.
Segundo registros, a entidade firmou dois ACTs com o INSS. O primeiro foi em dezembro de 2018, quando ainda era denominada Unibrasil e que foi anulado em outubro de 2020. A Controladoria afirma que a suposta procuração irregular teria sido um dos motivos que levaram ao cancelamento do Acordo.
“Posteriormente, o Acordo de Cooperação Técnica (ACT) foi anulado, conforme publicado em diário oficial em 5 de outubro de 2020 em razão de diversas irregularidades identificadas durante a fiscalização, dentre as quais se destaca a apresentação de uma procuração supostamente fraudulenta para validar o ACT, cuja data de assinatura é materialmente impossível, configurando possível fraude”, afirma o órgão.
Apenas dois meses depois da anulação, a entidade solicitou a celebração de um novo ACT, que foi formalizado em abril de 2021, já sob o nome Unibap.
A Unibap é uma das entidades sob suspeita das autoridades por suposto envolvimento na “farra do INSS”. O caso é investigado pela Polícia Federal (PF) no âmbito da operação Sem Desconto, deflagrada em abril deste ano. Segundo levantamentos da apuração, a associação arrecadou cerca de R$ 59 milhões até 2024 por meio dos descontos.
A análise da procuração faz parte de uma investigação da CGU que levou à abertura de um Procedimento Administrativo de Responsabilização (PAR) contra a Unibap. Os documentos do caso foram compartilhados também com a CPMI do INSS.
Defesa
A coluna questionou a Unibap sobre o fato. Segundo a defesa da entidade, a Unibap não tinha conhecimento da situação à época, momento em que a referida advogada atuava como estagiária no escritório de advocacia responsável pela elaboração da procuração.
“A inclusão ocorreu por iniciativa do próprio escritório de advocacia, sem que a Unibap tivesse ciência de que se tratava de uma estagiária sem registro ativo na OAB, afirmou a associação.
Para a entidade, tratou-se de um “erro administrativo do escritório contratado”, uma vez que a Unibap “não compactua com qualquer prática irregular”. Além disso, disse que assim que tomou conhecimento do fato, adotou providências.
“A entidade respeita a análise da CGU e está colaborando plenamente com os órgãos de controle, reforçando que não houve má-fé, e que todas as medidas corretivas foram adotadas para garantir total transparência e conformidade”, ressaltou.
A Unibap afirma, ainda, que não mantém mais vínculos com a referida profissional e “reafirma seu comprometimento com a ética, a legalidade e a transparência em todas as suas ações”.
Já Silvia Maria, então vice-presidente da associação, afirmou que todas as assinaturas realizadas em 2018 ocorreram em um contexto de “transição administrativa, com documento elaborados pela secretaria da entidade”.
Segundo ela, eventual divergência formal identificada pela CGU ou pelo INSS decorre de “erro administrativo de natureza material, sem qualquer intenção de fraude, retrodatação ou obtenção de vantagem indevida”.
“A Sra. Silvia enquanto parte da Entidade, sempre agiu com boa-fé, transparência e respeito à legislação vigente, permanecendo à disposição das autoridades competentes para todos os esclarecimentos necessários. Reitera, por fim, sua confiança nas instituições públicas e na correta elucidação dos fatos, convicta de que a apuração demonstrará a inexistência de dolo ou irregularidade em sua conduta”, afirmou em nota.
Fonte: Metrópoles
