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Magistratura e Judiciário de Rondônia promoveram avanços em defesa de autistas e suas famílias
A vida de uma pessoa com deficiência, infelizmente, é cercada por obstáculos e negativas de direitos. Isso também se aplica às pessoas autistas e, em muitos casos seus familiares.
Mas os magistrados e, de forma ampla, o Judiciário do Estado de Rondônia tem sido importantes atores para garantir a proteção de direitos individuais e coletivos destes grupos vulneráveis.
Ministério Público do Estado x Estado de Rondônia
Uma situação trágica é a negativa de acesso à educação. Ainda mais grave as condições que dificultam a inclusão e sepultam a possibilidade de um futuro para crianças.
Foi contra essa situação, persistente e recorrente nas escolas do Estado de Rondônia, que o Ministério Público Estadual ajuizou uma Ação e obteve êxito para determinar ao Estado de Rondônia pôr um profissional em educação nas escolas que existam estudantes autistas.
O Estado de Rondônia recorreu, mas a decisão foi mantida pelo Desembargador Relator Glodner Pauletto.
Segundo o dr. Glodner Pauletto, “ao aluno com deficiência deve ser garantido o acesso e a permanência na escola regular, comum e em igualdade de condições com os demais alunos”, afastanto a pretensão do Estado.
Assim, nos autos do processo nº 7001090-66.2018.8.22.0013, o Poder Judiciário Estadual, à unanimidade, buscou determinar a efetivação do direito à educação para crianças e adolescentes autistas.
Uso e fornecimento de canabidiol diante do direito fundamental à vida e à saúde.
Outra situação tida como mais complexa é quanto ao uso de medicamentos derivados ou por base o canabidiol, até recentemente sem aprovação da ANVISA, embora com muitos estudos promissores para pessoas autistas de todas as idades.
Mas para o Desembargador Roosevelt Queiroz, analisando o pedido de uma criança autista que só apresentou melhoras após a prescrição, por médico do SUS, de canabidiol, entendeu que deveria prevalecer a dignidade humana e o direito à saúde.
“Os princípios da dignidade humana e da preservação da saúde dos cidadãos impõe ao Estado (lato sensu), de modo solidário, a obrigação de fornecer medicamento em favor de pessoa carente, que comprova a necessidade do tratamento por prescrição médica. Comprovada a necessidade do medicamento e não tendo sido ele fornecido pela rede pública de saúde, há que se proteger a prerrogativa fundamental de inviolabilidade do direito à saúde e à vida“. Decidiu o magistrado no Processo n° 7000295-16.2020.8.22.0005.
Não foi o único caso deste tipo.
Anos antes, em 2019, o juiz Maximiliano Darcy David Deitos, da Comarca de Ji-Paraná reconheceu o direito de um pai e uma mãe de cultivarem até 15 plantas, quantidade considerada suficiente para a extração da quantidade para o tratamento, ou seja, 200 gramas da erva, produzindo-se 12 frascos de 100 ml para 6 meses (60 gotas, 3 vezes ao dia).
Isso para uso de tratamento da filha, autista e com coocorrência de epilepsia, uma vez que a compra da medicação à base de cannabis pelo Estado de Rondônia ficaria em mais de 35 mil reais por ano e, pelos pais, em valor bem mais elevado que seria o próprio cultivo.
Na demanda, assistida pela Defensoria Pública do Estado, foi determinado que as autoridades policiais se abstenham de impedir o cultivo ou apreender as plantas com fins medicinais da família.
Câmara de Vereadores x Prefeitura de Porto Velho
Um dos pontos que merece destaque do Judiciário foi na resolução de um litígio entre a Câmara de Vereadores e a Prefeitura de Porto Velho.
É que a Prefeitura pretendia ver declarada inconstitucional a Lei 2.782/2020 que instituiu em Porto Velho a “Política Municipal de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”.
Restou ao Desembargador Miguel Mônico conduzir o voto que manteve a constitucionalidade da Política Municipal em questão.
“Dessa forma, da análise da norma impugnada, que envolve políticas públicas do direito fundamental à saúde e dignidade da pessoa humana, de promoção obrigatória pelo Poder Público (já imposta na Legislação Constitucional, Federal e local), bem como por tratar de matéria que o Poder Executivo já dispõe de estrutura formada, não tendo o Legislativo criado ou estabelecido novas atribuições, mas apenas desenvolvido a competência já estabelecida pela norma, não se verifica a inconstitucionalidade suscitada”, registrou no voto na ADI nº 0801145-40.2020.8.22.0000.
Defesa do direito do consumidor e da integridade física e mental do paciente
Em outro recente caso, chegou a situação cada vez comum de negativa de atendimento à uma criança autista pelo plano de saúde.
A sentença explicitou que todas operadoras de planos de saúde que, por determinação judicial ou por mera liberalidade, estiverem atendendo autistas, dentre outros transtornos de desenvolvimento, por determinado método indicado pelo médico assistente, não poderão suspender o tratamento.
No caso, prevaleceu que a manifestação e prescrição de médico especialista deve ser respeitada com vistas a assegurar a integridade física e mental do paciente, de acordo com a ação nº 7006085-22.2022.8.22.0001.
Antes, em decisão de vanguarda em relação à escassez, à época, de uma uniformidade de entendimentos do STJ e STF, o Desembargador Raduan Miguel Filho manteve a determinação a outro plano de saúde para que ofertasse a terapia prescrita por médico (método em análise aplicada de comportamento, ABA).
Na decisão, o dr. Raduan Miguel posicionou-se que “no caso concreto, está em jogo a saúde, a qualidade de vida, e o desenvolvimento de uma criança, não podendo ser ceifada a oportunidade de ser tratada adequadamente”, de acordo com o processo n° 0804162-55.2019.8.22.0000.
Dessa maneira, o TJ/RO tem dando primazia à saúde, à dignidade humana e às regras do Código de Defesa do Consumidor.
Mudanças internas na dinâmica do trabalho
Mas não foi somente de decisões jurisdicionais e para a comunidade externa que o Poder Judiciário Estadual atuou. Desde maio de 2021, o Tribunal Pleno Administrativo do Poder Judiciário de Justiça de Rondônia aprovou a Resolução 198/2021 instituindo condições especiais de trabalho.
À época da edição da resolução, dados oficiais do órgão indicavam que mais de 60 servidores ou magistrados em Rondônia possuíam algum tipo de deficiência, seja ela física, visual, auditiva ou intelectual.
Outros quase 80 servidores/as convivem com essa realidade, tendo entre seus familiares e dependentes, pessoas com deficiência.
Desde a resolução, estes estão sendo beneficiados, além dos que são responsáveis por pessoas com doenças graves, deficiências ou que demandem de cuidados especiais.
Para o professor da Universidade Federal de Rondônia e advogado, Vinicius Miguel, que tem se dedicado à temática, “o Judiciário local, com reformulações administrativas, como a implantação do Núcleo de Acessibilidade, Inclusão e Gestão Socioambiental, bem como a instituição da Política Interinstitucional de Equidade de Gênero, de Raça e Diversidade no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Rondônia [em 2021] tem feito acenos importantes para a temática de inclusão e direitos de pessoas com deficiências. Ainda há muito por percorrer e tem-se sinais que a caminhada tem se iniciado!“.
Assim, a atuação de magistrados e desembargadores do Judiciário Estadual tem tido um robusto papel para a proteção de direitos humanos.
Contra um repertório de omissões do Poder Público, o Judiciário Estadual rapidamente determinou o amparo a este grupo vulnerável.
Fonte: Portal de Rondônia